terça-feira, 29 de setembro de 2009

Microfísica do cotidiano


O interesse na vida coletiva tem sido acometido, já há algum tempo, por uma desmotivação quase generalizada. Vê-se em curso no país, ao longo das últimas três décadas, uma apatia manifesta sobretudo na ação de organismos representativos dos diversos segmentos sociais.
À realidade social se soma, contudo, a partir do mesmo período, um desenvolvimento individual de exercícios de cidadania.

A Constituição de 1988, adulta que já é, revirou em 180 graus o conceito de controle social estabelecido historicamente e o designou norma magna. À medida que se alastra uma aparente reordenação das representações do corpo social, um crescente exercício de cidadania individual media ausências de manifestações organizadas.

Pessoas integradas à sua própria realidade desejam saber como essa se processa. A atenção às vias de sua concretização cotidiana reveste-se naturalmente de exercícios de poder. Antes, viver em si é poder. A começar das condições de dignidade e cidadania em meio ao qual se insere.
Parecer haver um senso comum prevalecente que ainda crê que o poder se exerce apenas através de atribuição delegada formalmente; para o que parece escapar a percepção de sua inerência à ação humana em todas as escalas de inserção ativa na sociedade. No ambiente privado. No ambiente público. Na escola, em casa, no trabalho e, inclusive, no lazer. Michel Foucault celebrizou isto em Microfísica do poder.

A busca de partilha de debates como este envolve o poder que se exerce nas escalas da individualidade. Manifestações muito mais vigorosas do que comumente se reconhece.

O debate público na Paraíba de hoje frutifica dessa escala de graduação do poder das instituições sociais. E se configura, sem dúvida, expressivo de visões de mundo e de mentalidades que imperam na realidade presente.

A estrutura de comunicação social que desenha o debate público na Paraíba hoje, parece empenhar-se, no mais das vezes, em desenhos de conjeturas sobre o que se aproxima para o comando dos rumos do Estado. Tentativas de exercícios de adivinhação do futuro substituem reflexões essenciais sobre caminhos para o desenvolvimento sócio, econômico e cultural e a sustentabilidade de planos e de gestões que objetivem a promoção desta caminhada.

Muito já se fala, embora modesta ainda seja a trajetória coletiva, acerca da sustentabilidade ambiental; entretanto, exercícios recentes de pensamento endossam demandas antigas da sociedade pela sustentabilidade administrativa como essência para qualquer outra busca de sustentação.

Sentimentos pessoais, desprezados comumente, entranham-se com princípios que norteiam a gestão pública e impõem-se vigorosamente maquiados sobre o debate público. A impessoalidade tão advogada carece de viabilidade. Por trás da agente pública, a pessoa pública. Por trás da pessoa pública, a pessoa.

Uma profusão de temas invade a mente e demanda reflexão. Uma manifesta disposição pela e para a transformação da sociedade aguça os sentidos para os invisíveis desígnios da subjetividade. Embora ainda infante o pensamento que vislumbra o impacto do ser na ação social, não é difícil acreditar que, a exemplo das manifestações de poder, o processo de transformação social dá realdade histórica a fatos instantâneos e fugidios e apela à atenção pública à necessidade de exercícios de transformação pessoal na microfísica do cotidiano.

A transformação social impõe a transformação individual. Resta saber que indivíduos realmente
se dispõem a ela.

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