sexta-feira, 9 de outubro de 2009


Governança e governabilidade

Eu e os meus companheiros
Queremos cumplicidade
Pra brincar de liberdade
no terreiro da alegria
Chico César

A governabilidade tem sido expressão recorrente no cenário dos poderes públicos do país. Executivo, Legislativo e Judiciário investem sobre o tema. A sociedade organizada e os meios de comunicação social o replicam. Como a cada cabeça equivale uma sentença, o significado atribuído à palavra varia conforme se conjugam essas forças políticas no contexto da civilidade nacional. À capacidade de sustentabilidade da governança, convém aferir a sustentação pretendida.

Tentativas de reflexão são abundantes acerca das possíveis causas e dimensões de uma notória crise de credibilidade social da gestão pública brasileira. É o que se ouve e lê, correntemente: o descrédito – popular – que se lhe circunda; vide as mobilizações na web já não tão recentes para o voto nulo. Não surpreende que se trate de traço parental com a história da gestão pública, embora haja quem depreenda como coisa da marca oficial contemporânea. Um pouquinho de conhecimento da história do Brasil parece ser suficiente para isto.

A reforma do Estado e a redefinição de suas funções já se evidenciaram imprescindíveis a sua adaptação aos, necessariamente novos, desenhos políticos da legítima e complexa representação dos interesses sociais condutores e/ou afetados pelas políticas governamentais. Recursos à coalização de forças sociais e a aplicação de instrumentos de co-gestão revelam um viés estruturante no processo de implantação das políticas públicas elencadas a partir de um projeto de governo.

Contudo, agentes públicos ou cidadãos que compreendem necessária a formação estratégica de coalizões políticas para viabilizar uma governança, porque mantêm o foco na busca de eliminação de gestões desnorteadas quanto ao desenvolvimento sustentável, são firmes em abrir perspectivas que se empenhem em escapar de modelos neoliberais de gestão da economia pública e apostar em ordens de caráter socialista e socializante.

Parece armar-se uma retórica em torno da construção de um Estado que, sem negar a complexidade intrínseca de sua desafiadora relação com o capitalismo contemporâneo, atente para a premente necessidade de humanização da gestão pública, e, ainda que restrinja sua atuação na produção direta de bens e serviços, reforce sua função reguladora das políticas públicas, enfatize seu papel coordenador das agências governamentais nos três níveis da organização federativa e reoriente suas próprias funções de controle, fomentando gradualmente a co-responsabilização da sociedade através de mecanismos e instrumentos promotores da civilidade e de esforçada praticação democrática.

Uma vez retomado o crescimento econômico, é o desenvolvimento político - o desenvolvimento das instituições democráticas - a pauta da vez do Brasil. A tentativa até aqui de pensar governabilidade e crise de governabilidade, busca remeter à origem estrutural-funcionalista dos sistemas políticos brasileiros. E aí compreender a urgência da reforma política no Brasil.

Uma reflexão que bem serve às necessidades que a sociedade incrédula demanda. Se por um lado, engloba características operacionais do Estado - eficiência da máquina administrativa, novos formatos de gestão pública, mecanismos de regulação e controle -, por outro não se deve desviar de sua dimensão político-institucional de capacidade de liderança e de coordenação, desde as iniciativas por coalizões de sustentação do governo, processo decisório, tradição ou inovação da representação de interesses, relações entre os sistemas partidário/eleitoral, àquelas arquitetadas entre os Executivo/Legislativo e o grau de interação público/privado na definição e na condução do desenvolvimento sustentável, com empenhada atenção à postura autoral do Judiciário.

Senão, qual a perspectiva para que os partidos políticos constituam-se efetivamente em reais parceiros do desenvolvimento, cumprindo sua função agregadora dos interesses da sociedade e responsabilizando-se perante o eleitorado, demostrando-se capazes de tomar iniciativas de propor políticas necessárias ao desenvolvimento sustentável socioeconômico, político e cultural do país? Vide o predomínio de um constrangimento eleitoral sobre o comportamento de parlamentares no Brasil; sintoma especialmente relevante quanto aos custos sociais que lhe são inerentes. Constrangimentos que afetam o comportamento dos partidos governistas e dos de oposição, de manifestação bienal a cada eleição, afetando diretamente a sustentabilidade administrativa das políticas públicas.

O que se tenta refletir aqui é o papel de todos os governantes do Brasil, qualquer que seja sua convenção ideológica, e a recorrência de seu envolvimento em um padrão de interação conflituoso com os sistemas partidário/eleitoral, impondo-se um crucial gargalo sobre a capacidade governativa.

Cabe então arrematar com uma pergunta essencial: que democracia a gente é capaz de construir? Afinal, hoje, qual é a liberdade brasileira para falar sobre e praticar a democracia?

Ei, gente do Brasil, e o terreiro da utopia?

Eu e minhas companhias... Aiá...

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